A CP – Caminhos de Ferro Portugueses - determinou a eliminação da paragem em Setúbal, e também em Alcácer do Sal, do intercidades saído de Lisboa com destino ao Algarve.
Esta decisão, concretizada a partir do dia 11 de Dezembro de 2011, é absolutamente inadmissível, por várias razões, e foi sustentada numa decisão unilateral que não envolveu nem utentes, nem trabalhadores, nem as autarquias afectadas diretamente por esta supressão de paragem do intercidades. De resto, todos estes interessados souberam da decisão praticamente nas vésperas dela se concretizar e pela comunicação social, o que demonstra, no mínimo, métodos muito pouco éticos por parte da CP.
Setúbal é uma cidade capital de distrito, concelho com mais de 120.000 habitantes. É absolutamente inaceitável que esta cidade deixe de “receber” o intercidades que faz ligação ao Algarve e que os seus habitantes tenham que passar a optar por se deslocar ao Pinhal Novo para aí poderem tomar o comboio para o Algarve.
Alega a CP, publicamente, que a deslocalização do intercidades poupará meia hora de viagem. Mas pergunta-se: poupará a quem? Aos habitantes de Setúbal não poupará certamente, na medida em que terão que somar ao seu tempo de viagem uma deslocação até ao Pinhal Novo, acrescendo tempo de viagem e custos de deslocação! Este argumento da CP, concretizado desta forma, não é tolerável, porque quando o tempo de viagem é encurtado com a supressão de paragens em pontos fundamentais, o serviço é prejudicado e não melhorado. É evidente que uma viagem, por exemplo, de Lisboa ao Porto, se não tiver qualquer tipo de paragem intermédia será muito mais rápida do que se essas paragens existirem. Mas pergunta-se: servir-se-ão melhor as populações e os utentes se houver comboios onde se promovam essas paragens, designadamente em cidades centrais, ou não? Uma coisa é encurtar os tempos de viagem com modernização do material circulante e das linhas ferroviárias, outra coisa é encurtá-los com o encerramento puro e simples de serviços fulcrais!
Recorde-se, ainda, que a estação ferroviária de Setúbal foi sujeita, há menos de 2 anos, a obras de modernização, onde se gastaram milhões de euros (perto de 15 milhões), e agora a CP desvaloriza este investimento erradicando dali a paragem do intercidades.
Repare-se também que o próprio PET (designado como Plano Estratégico de Transportes) não prevê, em lado nenhum, a supressão do intercidades da cidade de Setúbal, nem de Alcácer do Sal. É que se a somar aos cerca de 600 km de linhas ferroviárias que o PET pretende encerrar no país, ainda há a somar uma série de encerramentos de serviços e de ofertas não contabilizadas no PET, o que se está é a determinar um verdadeiro “assassínio” do transporte ferroviário de passageiros em Portugal!
A questão é que em Setúbal não se coloca apenas a grave questão de perda do intercidades que faz a ligação ao Algarve, mas também do serviço regional com ligação a Tunes. E repare-se como esta manobra foi “refinada”: primeiro, e já depois da modernização da linha do Sado, o regional passou a deixar de partir do Barreiro para partir do Pinhal Novo. Depois deixou de partir do Pinhal Novo para passar a partir de Setúbal. E agora vem a CP anunciar a supressão definitiva do serviço regional para Tunes! Ou seja, para que se perceba a manobra, foi-se encurtando o serviço regional, a partir do seu ponto de partida, para chegar um dia e dizer-se: é para suprimir! Isto é verdadeiramente inadmissível!
E francamente inadmissível é também Setúbal ficar assim, sem intercidades e sem regional, com ligação ao Algarve por via ferroviária! Uma capital de distrito que sempre teve forte relação com a mobilidade ferroviária.
Com o fim do regional são também um conjunto significativo de localidades do sul do distrito de Setúbal e do litoral alentejano que perdem ligação ferroviária.
Não deixa de ser caricato que estas decisões tenham sido anunciadas enquanto estava a decorrer a conferência de Durban, na África do Sul – a 17ª conferência do clima que visava tomada de decisões para a redução de gases com efeito de estufa (GEE) no período pós-Quioto. A cimeira fracassou nos seus objectivos e, cá em Portugal, o Governo português ajuda a fracassar nas necessárias medidas internas a adoptar para a redução de GEE, quando permite este tipo de medidas por parte da CP.
Em bom rigor, o setor dos transportes é o que mais tem aumentado ao nível de emissões com relevância para aprofundamento do fenómeno das alterações climáticas (fundamentalmente devido ao grande peso da componente rodoviária). De resto, o PET é a prova clara que o Governo quer fomentar ainda mais a componente rodoviária em detrimento da ferroviária que é a mais sustentável do ponto de vista ambiental. Tudo ao contrário dos objetivos a cumprir, portanto.
Para além disso, importa salientar que o direito à mobilidade das populações é um direito fundamental que tem que ser suportado por um serviço público de qualidade. Não é isso que está a acontecer. Esse direito à mobilidade está a ser desvalorizado e com ele arrasta o problema do isolamento de localidades do país, fomentando assimetrias locais e regionais que urge combater, mas que com este tipo de opções se acaba por acentuar.
Por último, importa reafirmar que uma empresa sustenta-se quando ganha passageiros. Tudo fazer para que se percam passageiros é uma gestão danosa de serviços que deve ser denunciada e que só tem em mira um objectivo: reduzir custos e oferta para entregar os transportes ao setor privado que gerirá depois os serviços em função do bolso dos accionistas e nunca das reais necessidades dos utentes. Despojado de passageiros, encostar-se-á depois ao Estado para garantir as suas indemnizações compensatórias e outras compensações por um serviço mal prestado e é assim que se prejudicam as pessoas no presente e se bloqueiam gerações futuras, com uma política errada de mobilidade que empobrece um país em vez de o engrandecer.
artigo de opinião da Deputada do PEV, Heloísa Apolónia, publicado no Setúbal na Rede:
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