terça-feira, 20 de maio de 2014

Privatização da EGF é um erro que sairá caro ao país


A privatização da EGF (Empresa Geral de Fomento), que o Governo impõe na senda de privatização de tudo e de mais alguma coisa, é um erro que sairá muito caro ao país.

Quando foram constituídos os sistemas multimunicipais para a gestão dos resíduos, com a participação dos municípios e da EGF (da grupo Águas de Portugal), o pressuposto que levou a que os municípios transferissem as suas obrigações legais nesta matéria para os referidos sistemas, foi a sua natureza pública. Integraram os sistemas com uma empresa pública de capitais públicos, tendo-lhes na altura sido imposto que detivessem 49% do capital e a EGF 51% (ou até mais), sendo esta a acionista maioritária. Assim, quando o Governo decide e abre um processo de privatização da EGF, trai a confiança dos municípios portugueses! A traição é de tal ordem, que o Governo nem permite aos municípios interessados a aquisição da maioria do capital das empresas multimunicipais.

Trata-se de um enorme desrespeito pela autonomia do poder local: o setor dos resíduos foi alvo de grandes investimentos públicos nos últimos anos, que o Governo se prepara para oferecer de bandeja aos privados e, para além disso, preparou uma política tarifária onde a ERSAR (Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e de Resíduos) fixa os preços e as autarquias são obrigadas a cobrá-los, mesmo discordando deles e mesmo que prejudiquem grandemente as populações.

O setor dos resíduos constitui praticamente um monopólio natural, com grandes garantias de controlo, de lucro e de isenção de risco para os privados. Repare-se que a EGF integra 11 sistemas multimunicipais (ALGAR, AMARSUL, ERSUC, RESIESTRELA, RESINORTE, RESULIMA, SULDOURO, VALNOR, VALORIS, VALORMINHO, VALORSUL), servindo mais de 6 milhões de cidadãos. Controlar e gerir os resíduos produzidos por mais de 60% da população portuguesa é um poder muito significativo que o Governo quer passar para os privados. Estamos a falar de um setor estratégico, com uma relação direta na qualidade de vida das populações e na criação de bons padrões ambientais.

A cooperação entre o Estado (através da EGF) e as autarquias tem permitido um caminho continuado de avanço notório na cobertura nacional de recolha e tratamento de resíduos, com indicadores que transmitem uma perspetiva de melhoria ao nível da qualidade e da eficiência. Não pode, portanto, o Governo alegar ineficiência dos sistemas. Para além disso, a EGF tem tido lucros consideráveis: nos últimos 3 anos representaram mais de 60 Milhões de euros. Não pode, portanto, o Governo alegar a falência do sistema.

O que leva, então, o Governo a cometer um erro estratégico desta natureza? É mesmo uma razão ideológica, porque PSD e CDS querem aproveitar, enquanto são Governo, para:

- Reduzir o Estado ao mínimo;
- Ajudar os grandes grupos económicos a acumular riqueza;
- Submeter todos os setores à lógica do mercado;
- Levar os cidadãos a ter acesso a serviços essenciais, pagando o serviço e o lucro das empresas.

Para aplicarem aquela que é a sua ideologia, preparam, na área dos resíduos, vários passos todos tendentes à privatização do setor, como o PEV denunciou em tempo útil, com a Lei nº 35/2013, de 11 de junho, que alterou a Lei da delimitação dos setores; o DL nº 92/2013, de 11 de julho, que alterou o regime legal da gestão e exploração dos sistemas multimunicipais e municipais de água, efluentes e resíduos; e, agora, o DL nº 45/2014, de 20 de março, que aprova o processo de privatização da EGF. A seguir preparam-se para a privatização do setor da água!

A evidência do prejuízo que resulta da privatização da EGF é de tal ordem, que o Governo está isolado nessa intenção, tendo os autarcas, ambientalistas e trabalhadores contra a sua decisão.

A privatização da EGF é muito problemática, por tudo o que já ficou expresso, mas também porque a ânsia de obter lucro se poderá seriamente incompatibilizar com o objetivo de redução da produção de resíduos (de resto, o Governo aprovou o processo de privatização da EGF sem ter aprovado um novo PERSU – Plano Estratégico de Resíduos Sólidos Urbanos - com metas ambiciosas de redução, cobertura, recolha e tratamento de resíduos. Para além disso, determinará que as decisões de investimento e de cobertura se façam não em função das necessidades das populações e do país, mas sim em função do que for mais rentável para os privados, os quais, sempre na ânsia de reduzir os custos do trabalho, o mais certo é que venham a pôr em causa uma parte dos cerca de 2000 postos de trabalho e, com isso, também a qualidade do serviço prestado. De não menor importância é o praticamente certo aumento das tarifas para tornar ainda mais rentável o negócio para os privados, sempre em claro prejuízo das populações. Sempre em prejuízo das populações!...

artigo da Deputada do PEV, Heloísa Apolónia publicado no Setúbal na Rede

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