quarta-feira, 14 de julho de 2010

Singularidades da identificação electrónica


O Sistema de Identificação Electrónica de Veículos e o Dispositivo Electrónico de Matrícula conheceu um percurso repleto de singularidades. Singularidades, porque, como se sabe, o Governo, no sentido de obter a respectiva autorização legislativa por parte da Assembleia da República, apresentou este Sistema como sendo um instrumento fundamental para reduzir a sinistralidade automóvel e para o incremento da Segurança Rodoviária.

Eram estes os objectivos primeiros da introdução deste sistema. Mas afinal, o Governo, ignorando completamente as recomendações da Comissão Nacional de Protecção de Dados, subverteu completamente a importância dos objectivos da Autorização Legislativa e transformou a Segurança Rodoviária num Sistema de Cobrança de Portagens.

Ora, operações desta natureza, que transformam Segurança Rodoviária em Sistema de Portagens, têm um nome e têm uma designação, e não estamos a falar apenas de magia, ainda que se trate de um número capaz de fazer inveja aos Mágicos. É sobretudo da ousadia do governo, em faltar à verdade aos Portugueses, porque de facto foi isso que aconteceu.

Aliás, no entendimento da Comissão de Dados, a restrição de direitos, liberdades e garantias dos cidadãos que este sistema transporta, só encontra justificação tendo em conta a ponderação dos interesses públicos envolvidos. Ora, os interesses públicos envolvidos e considerados, foram a “diminuição da sinistralidade automóvel e o incremento da segurança rodoviária”, que eram, recorde-se, os objectivos centrais da Autorização Legislativa.

De facto, a Implementação de um sistema de portagens, um verdadeiro big brother, através de um dispositivo de vigilância e controlo sobre os cidadãos é, na nossa perspectiva, inaceitável.

Tanto mais que o Governo se prepara para construir uma base de dados que pode ser facultada também aos concessionários e subconcessionários da Rede Rodoviária Nacional e a outras entidades.

Acresce ainda que, muito provavelmente, o Governo pretende proceder à concretização deste sistema através de instrumentos que excluem a fiscalização desta Assembleia, com todas as consequências que daí decorrem, no que diz respeito à transparência do processo, que seria mais que desejável, sobretudo tratando-se, como se trata, de direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.

Por fim e contrariando o Parecer da Comissão de Dados, que aponta para a necessidade de compatibilizar esta obrigatoriedade com a liberdade dos condutores de escolherem entre o pagamento através do sistema de leitura do dispositivo de matricula por radiofrequência e a cobrança por outros meios já existentes, o Governo pretende obrigar os actuais utilizadores do sistema de “Via Verde” a proceder à instalação do dispositivos electrónicos de matrícula, tornando o sistema “Via Verde” insuficiente como meio de pagamento, ao contrário do que hoje sucede.

São, portanto, muitas as singularidades deste sistema, que nos levam a entender que todo este processo deverá ser reponderado, o que passa necessariamente pela revogação dos diplomas que deram corpo à Autorização Legislativa, para que o Governo avançasse com este sistema.
Artigo de opinião do Deputado de "Os Verdes" na Assembleia da República, José Luís Ferreira, in Observatório do Algarve

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