Uma política de transportes com sustentabilidade ambiental, justiça social, equilíbrio territorial e em sintonia com as actividades e as potencialidades produtivas nacionais é condição fundamental de desenvolvimento de um país.
Porém, uma boa política de transportes, pode e deve ir mais além. Deve ser garante de igualdade de oportunidades como instrumento de acesso a bens e serviços públicos fundamentais, alicerces da nossa Democracia e do nosso Estado Social. Uma boa política de transportes assume que o transporte público de passageiros é condição essencial de acesso ao direito à mobilidade, e, por via deste, ao direito ao acesso à educação, aos cuidados de saúde, à informação, à cultura e ao lazer, bem como ao mais variados serviços públicos e satisfação de necessidades colectivas e individuais. Uma boa política de transportes deve ambicionar e procurar lograr a transferência de modos de transporte mais poluentes, com mais impactos negativos no ambiente, mais dependentes de combustíveis fósseis e consequentemente de importações, para modos de transporte mais sustentáveis ao serviço do ambiente, das pessoas, da economia e do equilíbrio na ocupação territorial.
Mas, além disso, uma boa política de transportes é uma política que é partilhada e comungada pela comunidade, que é compreendida e aceite pelos seus agentes e pelos seus destinatários.
O Governo elaborou e aprovou, em gabinete e sem discussão pública, o denominado “Plano Estratégico de Transportes – Mobilidade Sustentável – Horizonte 2011-2015” (PET). Nem empresas, agentes e parceiros do sector, nem comissões de utentes, nem sindicatos e outras estruturas representantes dos trabalhadores, nem associações foram ouvidos, em suma a sociedade em geral não foi chamada a participar na elaboração de um Plano com esta importância estratégica.
O PET constitui um Plano Sectorial, à luz do quadro jurídico dos instrumentos de desenvolvimento e gestão territorial (designadamente Lei nº48/98 de 11-08 – Bases da Política de Ordenamento do Território e Urbanismo – e DL nº380/99 de 22-09 – Regime dos Instrumentos de Gestão Territorial), para a área dos transportes, com evidentes incidências aos níveis territorial, ambiental, económico e social.
Ao nível territorial a incidência é óbvia, desde logo pelos inevitáveis impactos advenientes da implantação de infra-estruturas, lançamento de redes e de vias, mas, mais ainda pelas óbvias implicações que a existência, e mesmo o mero planeamento ou anúncio, de algumas dessas infra-estruturas têm na fixação de população, na atracção de investimento, no estímulo à actividade económica e na viabilidade de projectos de desenvolvimento nas regiões abrangidas, ou não, suficiente ou insuficientemente, por redes e sistemas de transportes públicos à altura das necessidades das populações e das actividades de cada região.
Ao nível ambiental, não só pela ligação umbilical existente entre ambiente e ordenamento do território aos mais diferentes níveis, a definição das redes de transportes constitui um poderosíssimo instrumento de modelação e de desenho do território e das actividades nele desenvolvidas, bem como dos tipos de ocupação do solo, mas ainda pelo peso extraordinário que o sector dos transportes desempenha ao nível das emissões de gases com efeito estufa e das alterações climáticas, bem como da dependência energética do estrangeiro, assente esmagadoramente em importação de energia fóssil e principalmente em petróleo cuja maioria é consumido em automóveis particulares.
Assim sendo, normal seria que este Plano, antes da sua aprovação em sede de Conselho de Ministros através de Resolução (entretanto já publicada – Resolução do Conselho de Ministros nº 45/2011 de 10-11), tivesse sido sujeito, nos termos do que o ordenamento jurídico nacional possibilita e prevê e à luz das melhores práticas políticas respeitadoras dos princípios fundamentais do direito administrativo e do ambiente da transparência e participação pública, que o Plano em causa tivesse sido sujeito a prévia Avaliação Ambiental Estratégica, com as devidas consultas designadamente a entidades e público interessados, a instituições e especialistas de reconhecido mérito, sendo finalmente submetido a consulta pública.
Tal procedimento permitiria, para além de colocar a proposta a escrutínio público, durante um período razoável, possibilitar um amplo e certamente riquíssimo debate nacional, portando contributos porventura valiosíssimos, e provavelmente fundamentais para permitir ao Executivo aprovar, afinal, um Plano mais consciencioso, útil para o interesse nacional, porque consentâneo com as necessidades de desenvolvimento do país.
É conhecida a crítica e oposição que o Partido Ecologista “Os Verdes” manifestou ao Plano em causa. Não retiramos uma palavra ao que dissemos. Este plano constitui uma estratégia de encerramentos, de privatizações, de despedimentos, de destruição de um dos pilares do nosso Estado Social, em suma um verdadeiro retrocesso civilizacional.
Porém, do que se trata com a presente iniciativa parlamentar, é antes de mais, a lisura da tomada de decisão que, em Democracia, não deve ser prepotente, nem apressada, não deve demonstrar medo ou insegurança, nem fugir à crítica sã e ao debate plural, frontal e esclarecido pela participação dos diferentes protagonistas do sector dos transportes.
O procedimento de decisão administrativa, mormente de um Plano Sectorial a médio ou longo prazo, com tantas e tão profundas implicações no futuro do nosso desenvolvimento, deve permitir aos portugueses o direito de se pronunciarem livremente em Consulta Pública e que essa pronúncia possa ter consequências no conteúdo da decisão final.
Assim, a Assembleia da República, reunida em sessão plenária. Delibera, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis recomendar ao Governo:
1 – A elaboração de um Relatório Ambiental identificando os efeitos significativos no ambiente resultantes da aplicação do “Plano Estratégico de Transportes – Mobilidade Sustentável – Horizonte 2011-2015” no território nacional, na economia e na sociedade portuguesas, bem como as suas alternativas razoáveis.
2 – A realização de consultas e a colocação em Discussão Pública do PET e respectivo Relatório Ambiental, por período não inferior a 60 dias.
3 – A determinação da suspensão de efeitos da Resolução do Conselho de Ministros nº 45/2011 de 10 de Novembro, até à conclusão do processo acima descrito.
4 – A alteração do PET em função dos resultados obtidos nos procedimentos acima recomendados.
Palácio de S. Bento, 17 de Novembro de 2011.
Os Deputados
Heloísa Apolónia
José Luís Ferreira
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